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Blog do Dan Josua

Ensinando nossos filhos a serem felizes sofrendo

Dan Josua

28/06/2018 04h00

Crédito: iStock

"Não foi nada, não foi nada; não precisa chorar, vai passar". Depois de um tombo bobo, essa frase pode ser uma das coisas mais carinhosas que um pai pode falar para seu filho. Depois de um tombo bobo, é uma forma de dizer para a criança levantar e tentar de novo.

Mas às vezes o tombo machuca. A queda é alta e a dor não passa tão rapidamente. Nessa segunda queda, muitos pais ajustam a sua conduta. Procuram por gelo e curativos. "Eu sei que tá doendo, mas o papai (ou a mamãe) vai cuidar e a dor vai passar, ok?" 

Esse ajuste fino reflete uma filosofia importante. A ideia de que querer a felicidade de nossos filhos não significa que não aceitamos suas dores. E, mais importante ainda, que as pessoas podem ser felizes mesmo com sofrimentos em suas vidas. 

Em última instância, o "vai passar" insistente –recusar a ideia de que crianças sofrem — nega a realidade do mundo. E, ao negar essa realidade, tiram da criança uma oportunidade incrível: a oportunidade de aprender a lidar com os seus sentimentos e com as suas dores. 

O que a psicologia tem demonstrado é que para saber lidar bem com os sentimentos é preciso saber reconhecê-los. Para isso, é fundamental que em algum momento um adulto nos ensine a validar esse sentimento. É preciso que alguém diga que isso é dor, e que é perfeitamente natural sentir dor. E que, se a gente deixar, a dor eventualmente vai embora. 

E que o mesmo vale para a tristeza, para a raiva, para o medo e até para a felicidade. Não há nada de errado em sentir, independentemente de qual o sentimento. Precisamos romper com o mito da felicidade perene. A vida, por mais protegida que ela seja, contém dor, decepções e tristezas. 

Queremos que nossos filhos sejam felizes, mas, o mundo sendo como ele é, não podemos protegê-los das dores que permeiam a vida. Em algum momento, todo mundo vai ouvir que não é amado de volta. E sentir a tristeza dessa decepção. Nesse sentido, felicidade (como objetivo) não pode ser um estado perene de alegria. Ao contrário, deve ser seguir vivendo uma boa vida, abraçando a experiência humana como um todo –as dores e as delícias.

Ensinar um filho a chorar quando sente dor talvez seja isso. Talvez seja ensinar, desde pequeno, que é possível ser feliz sofrendo.

 

Sobre o autor

Dan Josua é psicólogo, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Fez especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP (Universidade de São Paulo) e tem formação em Terapia Comportamental Dialética pelo Behavioral Tech / The Linehan Institute, nos Estados Unidos. Atua como pesquisador e professor no Paradigma - Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento e dá cursos pelo Brasil afora ajudando a difundir a DBT pelo país.

Sobre o blog

É muita loucura por aí. Trânsito, mudanças climáticas, tensões em relacionamentos, violência urbana, maratona de séries intermináveis, spoilers em todos os cantos, obrigação de parecer feliz nas mídias sociais, emoções à flor da pele. O blog foi criado para ser um refúgio de tudo isso. Um momento de calma para você ver como a ciência do comportamento humano pode lhe ajudar a navegar no meio de tanta bagunça.

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