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Blog do Dan Josua

Pare de tentar "pensar positivo" e viva de forma positiva

Dan Josua

30/11/2017 04h00

Crédito: iStock

A tristeza é um sentimento limpo. Tem começo, meio e fim. Convida ombros quando precisa. Tristeza é sofrer sem perder a esperança de que sofrimento tem fim.

Depressão não é tristeza. Depressão é uma nuvem pesada que nos isola do mundo. Faz fechar a persiana durante o dia e acampar embaixo da coberta. A depressão é um demônio que martela que somos fracos, incompetentes e não merecemos o amor das pessoas a nossa volta.

Desse escuro solitário, esses pensamentos negativos às vezes são tão altos que parecem gritar. Pensamentos injustos que nos condenam com uma força brutal.

E o que frequentemente ouvimos por aí é que, enquanto estivermos pensando de forma negativa, vamos continuar sofrendo desse jeito. "Pense positivo" é a mensagem padrão. O bordão mágico que resolveria todos os problemas. Para nos sentirmos melhor, nessa perspectiva, "basta" convencer nossa mente a se sentir melhor –corrigi-la ou encontrar um nó escondido no nosso passado que, uma vez desatado, vai permitir que a vida volte a fluir.

Às vezes, os pensamentos são tão doídos e esse coro mandando a gente pensar positivo tão insistente, que esquecemos de ver a persiana fechada. Esquecemos que no meio da dor, acabamos nos isolando no escuro. Que deixamos de fazer as pequenas coisas na vida que nos davam prazer. Esquecemos de ir até as pessoas com quem poderíamos dividir nossas lágrimas.

Esquecemos de imaginar que talvez os nossos humores não sejam consequências de nossos pensamentos, mas da caverna onde nos encontramos.

Não me entendam mal: pessoas deprimidas, de fato, costumam ser excessivamente duras consigo mesmas e seus pensamentos, excessivamente negativos. No entanto, novas perspectivas tem sugerido que esses pensamentos são consequências da maneira como essas pessoas têm conduzido as suas vidas. As pessoas deprimidas se sentem desse jeito por terem (geralmente aos poucos) se afastado de uma vida que consideram valorosa —e não por pensarem de forma distorcida.

O pensamento não faz com que eu vá fechar a persiana; ao contrário, é a falta de luz que parece aumentar o volume e a severidade desses pensamentos autodestrutivos.

Nos últimos anos, um novo tipo de terapia, construído em torno dessa ideia de que nossa vida acontece antes dos nossos pensamentos e humores, tem despontado. Chamada de Ativação Comportamental, ela é composta, basicamente, de uma série de estratégias para ajudar o paciente a (gradualmente) voltar a reconstruir uma vida mais plena. É uma terapia cujo funcionamento é bastante simples, mas evidências científicas recentes têm demonstrado que ela parece funcionar melhor do que as tentativas de se dedicar primariamente a modificar os pensamentos depressivos.

A mensagem por detrás desse sucesso é poderosa. Vamos retomando o que talvez intuíssemos sozinhos, antes de qualquer terapia ter aparecido no mundo. Nas palavras simples de Abraham Lincoln: "Quando eu faço o bem, eu me sinto bem. Quando faço o mal, eu me sinto mal".

Se amo nadar, felicidade é consequência de mergulhar na piscina. Se me sinto sozinho, meu sentimento começa a mudar quando tomo coragem e encontro aquele amigo que me faz falta. Para os músicos, fones de ouvido. Para os escritores, papel e caneta. Para os boleiros, futebol.

A grande pegadinha da depressão é que, ao mesmo tempo em que voltar à vida plena nos ajuda a nos sentir melhor, quando estamos deprimidos é extremamente difícil conseguirmos energia até para sair da cama. Por isso, é fundamental um profissional qualificado que possa ajudar a programar a tarefa certa para, aos poucos, começarmos a sair do buraco da depressão. Uma atividade com o esforço possível nesse momento – nem excessivamente exigente nem excessivamente leniente. É preciso encontrar o tijolo exato que vai ajudar a sustentar a vida valorosa que fará com que nos sintamos melhor.

O órgão mais poderoso para cuidar das nossas emoções, não é nosso cérebro, mas nossas pernas – que podem nos levar a lugares e a pessoas que amamos.

Por mais difícil que isso possa parecer para quem está dentro do quarto escuro e solitário.

Ps: depressão é uma doença séria e precisa de acompanhamento profissional. Caso você ou alguém próximo esteja se sentindo desse jeito, procure um psicólogo ou um médico psiquiatra.

Sobre o autor

Dan Josua é psicólogo, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Fez especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP (Universidade de São Paulo) e tem formação em Terapia Comportamental Dialética pelo Behavioral Tech / The Linehan Institute, nos Estados Unidos. Atua como pesquisador e professor no Paradigma - Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento e dá cursos pelo Brasil afora ajudando a difundir a DBT pelo país.

Sobre o blog

É muita loucura por aí. Trânsito, mudanças climáticas, tensões em relacionamentos, violência urbana, maratona de séries intermináveis, spoilers em todos os cantos, obrigação de parecer feliz nas mídias sociais, emoções à flor da pele. O blog foi criado para ser um refúgio de tudo isso. Um momento de calma para você ver como a ciência do comportamento humano pode lhe ajudar a navegar no meio de tanta bagunça.

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