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Blog do Dan Josua

Dinheiro ou reconhecimento: o que nos deixa mais feliz no trabalho?

Dan Josua

22/02/2018 04h15

Crédito: iStock

Na mitologia grega, Sísifo foi condenado a carregar a mesma pedra todos os dias até o alto de uma montanha, apenas para ver ela rolar para baixo no fim da jornada. A dor de sua punição não vinha tanto do trabalho árduo que ele precisava realizar, mas da repetição sem sentido. A mesma pedra, diariamente, sem que isso significasse nada. Nem um sorriso no pico da montanha, nem uma casa se montando com o acúmulo de rochas.

A dor de Sísifo não era, atenção, a do trabalho repetitivo, mas a de uma repetição que não produzia mudanças no mundo.

Os gregos já sabiam o que a sociedade moderna parece ter esquecido: nossa felicidade no trabalho não vem tanto do prazer produzido por uma determinada tarefa quanto do significado que atribuímos a ela.

O psicólogo israelense Dan Ariely demonstrou isso em uma série de experimentos.

Em um deles, Ariely pediu que os participantes fizessem um desenho simples em uma folha de papel. Quando a pessoa terminava uma cópia, ela ganhava uma pequena recompensa, a qual ia diminuindo com o tempo. Se com o primeiro desenho recebia um dólar, no segundo ganhava 80 centavos de dólar e assim por diante.

O primeiro grupo de participantes era avisado que seus desenhos seriam jogados fora depois. Mas cada folha entregue era recebida com um sorriso do pesquisador e guardada com cuidado em uma gaveta.

Já o segundo grupo da experiência via o seu desenho ser despedaçado por um triturador de papel. E, no terceiro grupo, os trabalhos feitos pelos participantes eram ignorados pela pessoa que os coletava (que simplesmente apontava, de um jeito frio, para uma pilha de papéis).

O grupo que recebeu um leve sorriso se mostrou muito mais resiliente do que os outros dois, cujos resultados foram bastante semelhantes (e, diga-se, ruins).

Essa pesquisa aponta para uma direção clara: satisfação e persistência no trabalho andam de mãos dadas com a sensação de que aquilo que eu estou fazendo significa alguma coisa. Mesmo que esse significado se resuma a um simples sorriso.

Aliás, a sutileza do pequeno sorriso é fundamental.

É bastante fácil entender que um médico distribuindo antibióticos para crianças abandonadas em meio a uma guerra civil perceba que o seu trabalho tem um significado. Ora, ele está, literalmente, salvando vidas de crianças abandonadas! Mas e o resto de nós?

Talvez, para entender o nosso impacto mais mundano, seja interessante pensar em profissionais que, em geral, sentem que o seu trabalho é importante, mas não estão (exatamente) mudando o mundo: os jogadores de futebol. Porque, sendo racional, o mundo não fica nem melhor nem pior se o Corinthians, e não o Palmeiras, vence o Campeonato Brasileiro.

O jogador de futebol acha que o seu trabalho é importante, porque a sociedade deixa muito claro essa realidade –das mesas redondas dominicais às faixas com o seu nome, ele é exaustivamente lembrado de que o que faz em campo vale a pena.

Retornamos, portanto, ao detalhe fundamental da pesquisa com os desenhos: a ilustração feita parece pesar menos do que o fato de ser recebida com um sorriso ou com indiferença. Ou seja, se uma atividade qualquer não é intrinsicamente importante, vamos nos manter motivados conforme o impacto que ela exerce em nossos pares.

Assim, se quer se motivar no trabalho, sugiro duas opções: junte-se a uma causa que seja preciosa para você. Talvez queira se envolver em um movimento como o "Médicos sem Fronteiras".

Se não é o caso ou se isso não é possível, então procure um chefe que o valorize e um time de colegas que o incentive. A médio e longo prazo, isso vai ser muito mais importante do que bônus no final do ano.

E, se você é o chefe, pague bem no fim do mês. Mas também se lembre de sorrir e elogiar no dia a dia. Mostre, ainda, como o trabalho da sua equipe é valioso para a empresa.

Respondemos com maior entusiasmo a pessoas que nos valorizam do que a moedas. Quem diria?

Sobre o autor

Dan Josua é psicólogo, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Fez especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP (Universidade de São Paulo) e tem formação em Terapia Comportamental Dialética pelo Behavioral Tech / The Linehan Institute, nos Estados Unidos. Atua como pesquisador e professor no Paradigma - Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento e dá cursos pelo Brasil afora ajudando a difundir a DBT pelo país.

Sobre o blog

É muita loucura por aí. Trânsito, mudanças climáticas, tensões em relacionamentos, violência urbana, maratona de séries intermináveis, spoilers em todos os cantos, obrigação de parecer feliz nas mídias sociais, emoções à flor da pele. O blog foi criado para ser um refúgio de tudo isso. Um momento de calma para você ver como a ciência do comportamento humano pode lhe ajudar a navegar no meio de tanta bagunça.

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