Terapia quântica e outras coisas que podem soar científicas, mas não são
A solução quântica aparece toda vez que um super-herói precisa explicar algo inexplicável. Viagem no tempo? É por conta das partículas quânticas. Mágica? Isso mesmo: enlaçamento quântico. Diminuir o tamanho do corpo humano infinitas vezes? Você adivinhou: mundo quântico. Essa palavrinha mágica aparece para dar um tom científico a um discurso que, se a gente olhasse com um pouco mais de calma, veria que não faz lá muito sentido.
Confesso que, quando estou vendo esses filmes, coloco pipoca para dentro, dou um gole de refrigerante e me deixo levar. Adoro e sempre adorei tudo que tem a ver com super-heróis. Não vejo problema quando um pouco de pseudo-ciência invade as telas de cinema.
Agora, quando o assunto é saúde mental e educação, a coisa não é tão simples.
E, infelizmente, os tratamentos quânticos –de psicoterapeutas a coachs e educadores — têm pipocado pelo país. Apesar do nome ser derivado da Física, esses tratamentos não estão bem ancorados em princípios científicos.
É duro ter que dizer isso, mas nenhuma teoria psicológica bem estabelecida pode dar conta dos tais fenômenos quânticos. A complexidade e a estranheza de partículas elementares não puderam ser transportadas para o estudo científico do comportamento humano. Muitas e muitas lacunas precisarão ser preenchidas para que isso ocorra. Ora, a verdade é que o movimento dessas partículas não pode ser exportado nem para a compreensão de grandes massas e velocidades no campo da própria Física –a chamada teoria unificadora que uniria as descrições da Relatividade com as da Física quântica ainda é apenas uma promessa, que dirá para o estudo do ser humano…
Talvez (um dia, quem sabe) a nossa compreensão da Biologia e da Física será tão completa e unificada que a psicologia será apenas um capítulo desse livro gigantesco. Esse dia, porém, ainda está bem distante. Por enquanto, para entender comportamento humano, não investigamos quarks e nêutrons, mas o cérebro, a genética e as atitudes de homens e de outros animais. Acredite, isso já é difícil o bastante.
E, já que mencionamos a genética, vale deixar claro: tratamento de mudança de DNA, em psicoterapia, também não tem bases estabelecidas na ciência. Sim, termos difíceis da biologia dão um peso para os proponentes desse tipo de terapia. Mas esses nomes complicados são apenas isso: nomes. Porque, se é verdade que algumas experiências de vida podem alterar a expressão do código genético (ressalva, a epigenética, nome do estudo das transformações na expressão do código genético, é de fato importante), isso não quer dizer que um psicólogo, coach ou educador possa atuar de forma proposital sobre esses mecanismos.
Afinal, como um profissional poderia investigar mudanças nas expressões gênicas de seus pacientes? Fazendo uma avaliação das mudanças das células de cada um de seus clientes? Como? Selecionando todos os grupos celulares, ou apenas de um determinado tipo, como neurônios, por exemplo?
É pouco provável que o profissional da mudança de DNA, como o da mudança quântica, possa responder essas perguntas. Afinal, não é um estudo meticuloso de ciência que está por trás dessas intervenções…
Mesmo sem bases sólidas, essas palavras de impacto podem convencer muita gente. Há um charme nelas, já que denominam conceitos complexos da Física quântica ou da epigenética. Por isso, sempre recomendo que, ao procurar por ajuda em saúde mental, o paciente procure por profissionais registrados em seus respectivos conselhos (Conselho Federal de Psicologia ou de Medicina, por exemplo). Se possível, entre eles, ainda procure por quem frequente congressos científicos reconhecidos.
De resto, tente não se encantar com termos que soem muito bacanas, pois eles com frequência são vazios. E, mais que tudo, lembre-se do clichê: se a promessa é demais, o santo deveria mesmo é desconfiar.
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