O que realmente queremos que as crianças aprendam na escola?
O dia dos professores foi celebrado há alguns dias. A data é uma oportunidade de agradecer a esse grupo de profissionais que nos ensinou a imprimir a mão com tinta no papel, depois nos mostrou o significado das letras que formam este texto e, por fim, tentou nos convencer de que fórmulas matemáticas seriam importantes quando saíssemos da escola.
Foi dia de agradecer a esses profissionais que fazem a base de um país rico de verdade. Masa data também serve para refletir se os nossos professores puderam nos ensinar tudo o que a gente deveria ter aprendido. Se, por um lado, o valor de uma boa alfabetização e noções de matemática é indiscutível, por outro, parece que algumas coisas fundamentais ficaram de fora de seus ensinamentos.
Ou seja, sem jogar fora a importância de tudo o que aprendemos em sala de aula, talvez esteja na hora de questionarmos para que serve a educação que passamos tantos anos recebendo. Qual o seu objetivo final? A resposta padrão nos colégios onde estudei — "formar cidadãos para o mundo" — , cá entre nós, esclarece muito pouco. Afinal, quem são esses tais "cidadãos para o mundo"? O que eles precisariam fazer? E como o que aprendemos em sala de aula prepara esse cidadão?
Com frequência, tenho a sensação de que por trás dessa ideia bonita de cidadania, existe uma dificuldade para descrever com precisão os atos e os conhecimentos que uma pessoa deveria ter ao se formar. Confesso que não tenho nem metade das respostas para essa questão. Ainda assim, acredito que vale a pena se perguntar com sinceridade: o que um adulto deveria saber?
Calcular seus impostos? Entender a ciência por trás do aquecimento global? Saber como produzir energia a partir do lixo? Conhecer as particularidades e sintaxe de sua língua-mãe e ter uma noção básica da linguagem matemática? Ser capaz de elogiar um colega ou de reconhecer injustiça e saber combatê-la? E quanto a reconhecer suas emoções e ter estratégias para manejá-las?
De novo, preciso admitir que não tenho as respostas. Mas o campo da psicologia vem, nos últimos anos, propondo que diversas habilidades sócio-emocionais também deveriam ser ensinadas na escola. A ideia é que aprender a se comportar de forma saudável precisaria ser matéria obrigatória — ou seja, tão importante quanto história ou geografia.
Iniciativas fantásticas que buscam ensinar habilidades para a vida para crianças e adolescentes, como as do método FRIENDS e do DBT-STEPS, apenas para citar dois exemplos, já fazem parte de currículos de alguns colégios espalhados pelo mundo. Esses programas sugerem que ao lado de outras matérias o professor seja treinado a ensinar estratégias de manejos de emoções e comunicação saudáveis para crianças.
Mesmo fora desses programas mais estruturados, classes com aulas de meditação já tem se tornado lugar comum em algumas escolas de São Paulo, por exemplo. E faz sentido que seja assim, afinal, a meditação é uma maneira de aprender a focar a atenção, ou seja, de se tornar mais capaz de aprender.
Alguns estudos com universitários têm mostrado que a simples prática meditativa todos os dias é capaz de aumentar suas médias em avaliações, por exemplo. Em outras palavras, parece importante olhar não apenas para o que aprender, mas como podemos cuidar da pessoa que está aprendendo. A meditação, nesse caso, um exemplo de como uma habilidade para a vida, saber focar a atenção em uma coisa tão simples quanto a própria respiração, pode ter efeitos importantes no aprendizado como um todo!
Sei que vivemos em um país onde a simples alfabetização às vezes ainda é um objetivo distante. Nessa realidade, fica difícil sonhar com essa educação para uma vida melhor, focada no bem estar do estudante. Ainda assim, me parece que manter um olho nisso seja importante para garantir a educação de qualidade que o brasileiro tanto precisa.
Por fim, é preciso deixar claro que a dificuldade para responder essas questões não é falha de qualquer um dos professores que se matam para ensinar em suas salas de aula, frequentemente sem o aporte necessário e fazendo milagres com o que tem. Também não é uma crítica à matemática ou a qualquer uma das matérias do currículo básico. Não, o problema está em uma cultura que ainda não respondeu com clareza o que quer que suas crianças aprendam. E como quer que elas lidem com o aprendizado e com o mundo complexo a sua volta. Parece, às vezes, que ainda não definimos, enquanto cultura, nossas prioridades.
A minha resposta, como alguém que lida com sofrimento humano todos os dias, é a de que é fundamental começar a olhar para o estudante que está aprendendo. Como ele está se sentindo? O que o faz sofrer? O que brilha seus olhos de interesse? Apenas quando olharmos para as necessidades concretas de nossas crianças e adolescentes, estaremos fazendo jus à educação que eles merecem.
[PARA SABER MAIS]:
Meditação e retenção de conhecimento
Bamber, M. D., & Schneider, J. K. (2016). Mindfulness-based meditation to decrease stress and anxiety in college students: A narrative synthesis of the research. Educational Research Review, 18, 1-32.
DBT-STEPS
Mazza, J. J., Dexter-Mazza, E. T., Miller, A. L., Rathus, J. H., & Murphy, H. E. (2016). DBT? Skills in Schools: Skills Training for Emotional Problem Solving for Adolescents Dbt Steps-a. Guilford Publications.
Método FRIENDS no Brasil
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