Natureza tem efeito impressionante no cérebro, e tem explicação
O efeito da natureza no nosso cérebro é poderoso. E conhecido há muito tempo. Aristóteles, que viveu em Atenas de 384 a.C.a 322 a.C., acreditava que caminhadas ao ar livre clareavam a mente. Einstein e Darwin usavam de caminhadas em jardins como parte importante de seu processo criativo. E cada um de nós que já mergulhou sozinho no mar sabe disso: existe uma mudança quando nos vemos rodeados por algo que é maior do que nós mesmos.
Mas o que acontece na natureza que faria a gente se sentir assim? Segundo a hipótese biofílica, popularizada pelo biólogo americano Edward O. Wilson, os seres humanos evoluíram para viver do lado de fora. Nossos corpos e mentes se desenvolveram para se harmonizar com rios e montanhas e não com prédios e ruas de asfalto. Somos, em última instância, animais conectados de alguma forma ao ambiente que nos criou. Mas que fique claro: isso não é um argumento contra a civilização moderna. Esgoto e antibióticos foram conquistas incríveis para superarmos nossas limitações.
Ainda assim, é preciso compreender as condições às quais o nosso corpo se adaptou para sobreviver — e os efeitos dessa adaptação são verdadeiramente notáveis. Por exemplo: há quem argumente que as altas taxas de miopia em alguns países do leste asiático, que chegam a 90%, se devem ao fato de que os jovens das grandes cidades da região com frequência não entram em contato suficiente com luz do sol. Aparentemente, a vitamina D produzida graças ao banho de luz natural ajudaria a moldar o formato dos olhos e, na ausência desse nutriente, a chance de óculos serem necessários se tornaria maior.
No entanto, e mais importante, existe alguma paz no som de grilos que não é reproduzida pelo barulho constante de carros das grandes cidades. Segundo os proponentes da hipótese biofílica, o nosso corpo usa simultaneamente todos os seus cinco sentidos, desenvolvidos ao longo de sua evolução, apenas quando está próximo de seu habitat. Assim, a paz encontrada no contato com a natureza é diferente da encontrada nas grandes cidades. Mesmo quando a mesma atividade está sendo executada.
Cientistas da universidade de Chiba, no Japão, compararam as respostas fisiológicas de centenas de pessoas fazendo caminhadas na floresta e no meio da cidade. E os resultados são impressionantes. A diminuição do nível de cortisol de quem caminhou no mato foi 12% maior do que a redução em quem caminhou na cidade. Houve também uma queda significativamente maior na diminuição dos batimentos cardíacos e na pressão sanguínea. Além disso, os resultados registrados em testes de psicologia foram consideravelmente melhores nas pessoas que caminharam na natureza. Ou seja, em todas as avaliações — fisiológicas e psicológicas — o estresse parece diminuir mais na caminhada na terra em comparação àquela feita no asfalto.
Se é comum falarmos da importância do exercício físico para a saúde mental, é interessante notar esse aspecto. O exercício feito na natureza parece produzir efeitos mais fortes do que aqueles realizados em ambientes construídos pelo homem. De novo, não é preciso tanto teste: quem nada em piscina e no mar sabe a diferença entre um mergulho e o outro.
Os efeitos da natureza em nosso cérebro não se limitam ao bem-estar, no entanto. Pesquisadores da Universidade de Utah, nos Estados Unidos, descobriram que apenas quatro dias fazendo trilhas já aumentam a capacidade cognitiva significativamente. Em um teste de associações criativas, as pessoas que fizeram o teste após o contato com o deserto de Utah tiveram notas 50% maiores do que aqueles que fizeram o mesmo testes, só que antes de iniciar o passeio.
Segundo os autores, é possível que o contato com a natureza reajuste algumas funções mediadas pelo nosso córtex pré-frontal, que podem estar prejudicadas por um excesso de contato com aparelhos eletrônicos, por exemplo. Simplificando um pouco, podemos dizer que os autores acreditam que estar na natureza pode ser um antídoto para um mal-estar ligado ao nosso excesso de conectividade virtual.
O estudo ainda é preliminar e precisa ser desenvolvido para se chegar a conclusões mais precisas sobre o efeito da natureza em nossa capacidade cognitiva. O que fica de marcante é um interesse crescente em considerar como nossa mente muda quando colocamos nossa cabeça próxima do ambiente natural em que ela se desenvolveu.
Muitas outras experiências preliminares poderiam ser citadas. Um programa de rafting e caminhada para veteranos do exercício americano ou um programa de trilhas nas montanhas do Colorado para mulheres vítimas de abuso são apenas dois exemplos. É verdade que o poder dessas experiências como adendos aos tratamentos profissionais ainda está sendo estudado (não temos evidência científicas sólidas, ainda). Mas os testemunhos dos envolvidos são impressionantes: cada um deles se diz transformado após três dias, em média, de contato profundo com a natureza.
É preciso esperar a área se desenvolver antes de recomendar esses passeios como forma de tratamento para transtornos mentais. Não estamos, de modo algum, em um momento em que esse tipo de iniciativa poderia substituir tratamentos psicológicos ou psiquiátricos tradicionais. Mas é animador pensar que mais uma arma pode estar surgindo no combate a esses problemas.
Seja como for, eu posso, com confiança, dizer da minha experiência: há algo transformador na massagem gelada de uma cachoeira – e que não se compara a uma ducha em casa.
Para saber mais: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0051474
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