Esgotado como nunca? Por que videoconferência cansa e o que você pode fazer
"Em uma videoconferência, a sua câmera deve estar um pouco acima da altura dos seus olhos e é interessante que uma luz indireta, como a de um abajur, esteja apontada para a parede, vinda do seu melhor lado" — foi o que escreveu uma cinegrafista de Hollywood em um texto que surgiu do nada no meu feed. Eu, que nem sabia que as pessoas tinham um lado melhor, quase perguntei em casa se eu deveria iluminar o meu lado esquerdo ou o direito.
Mas, pensando nisso, eu me dei conta de que esse negócio de vídeoconferência todos os dias acabará deixando a gente meio enlouquecido. Simplesmente porque nosso cérebro está tão apto para esse tipo de conversa. A maneira como o vídeo é processado, comprimido e armazenado em aplicativos como Zoom ou Skype faz com que ele muitas vezes apareça cheio de pixels, com a imagem quebrada em inúmeros quadradinhos, sem contar os instantes de congelamento da tela, atrasos da imagem em relação ao som… Acredite: cada um desses pequenos erros retira a naturalidade de nossa comunicação.
Por exemplo, em uma conversa convencional, ao vivo e em cores, cara a cara, sem nos darmos conta repetimos as microexpressões faciais da pessoa à nossa frente. Essa é a maneira que nosso cérebro arruma para a gente se sentir de maneira semelhante ao que o nosso interlocutor está sentindo. Em outras palavras, é inclusive por conta desses movimentos involuntários que experimentamos empatia.
Já em uma típica videoconferência, a qualidade da imagem não é boa o bastante para o cérebro captar essas sutilezas no rosto que está na tela. Veja que interessante: cancela-se, dessa forma, o processo subconsciente de sentir o que a outra pessoa está sentindo. E, na ausência desse processo automático, precisamos fazer um esforço deliberado para decodificar o conteúdo emocional de qualquer mensagem, o que deixa tudo mais obscuro e a conversa, mais desgastante.
Além disso, pelo menos segundo uma pesquisa feita na Alemanha, mesmo pequeníssimos atrasos em transmissões, que podem não chegar no máximo a 2 segundos e que muitas vezes nem sequer são percebidos conscientemente, mudam (para pior) a maneira como avaliamos a pessoa com quem conversamos remotamente.
Até mesmo gestos banais, como fazer um breve momento de silêncio, ganham interpretações diferentes quando acontecem em uma videoconferência. Se, em uma conversa presencial, a ausência de falas vez ou outra pode ser uma marca de intimidade ou de paciência, em comunicações via internet esses intervalos geram ansiedade, até mesmo sobre o funcionamento adequado da tecnologia —será que travou?
Não é à toa que boa parte das videoconferências são pontuadas por irritantes checagens –"você está me ouvindo?" ou "hmm, acho que você travou aqui" ou "não estou te vendo mais" etc. E não é difícil perceber como essa preocupação com a própria tecnologia e com ser compreendido deixam a conversa mais cansativa. Basta perceber quanta energia é consumida só a para relembrar sobre o que estávamos falando antes de o sinal da conexão se perder.
A preocupação que talvez tenha sido responsável por me levar até o texto da cinegrafista ensinando a posicionar a webcam sugere que a presença da nossa própria imagem também é fonte de ansiedade. É difícil se concentrar no que a outra pessoa fala enquanto o canto superior da tela mostra o seu cabelo despenteado, olheiras e afins. Ou notar a cara estranha que você não sabia que fazia enquanto presta atenção.
Saiba que essa ansiedade que nos faz ficar mais calculistas sobre a maneira como aparecemos também dificulta segurar o fio da meada da mensagem que vem do outro lado. E o processo de dirigir a atenção de um tema (a própria imagem) para o outro (o que a pessoa está dizendo) é custoso do ponto de vista cognitivo. Ou, falando mais claramente, cansa demais.
Aquela caixinha amarela que se ilumina quando é a nossa vez de falar talvez seja a cereja no bolo desse processo. Mais do que em reuniões presenciais, esse tipo de sinal pode dar a sensação de que você é o centro das atenções. A importância subjetiva da sua fala –que, nesse ponto, começa a se assemelhar a uma apresentação – aumenta. Fica difícil não iniciar uma performance que vai esgotando ainda mais a nossa energia.
Ou seja, conversas e reuniões por videoconferência são desgastantes pois quebram uma série de processos naturais e automáticos da nossa comunicação e exigem que a gente preencha os espaços com um esforço de atenção mais deliberado.
Vivemos tempos estranhos e cheios de ansiedade. Tempos em que não apenas todo o nosso contato social é mediado por tecnologias que ainda estão distantes do nosso ambiente natural, mas em que todas as nossas interações acontecem no mesmo lugar. É quase como se encontrássemos nossos amigos, nossos filhos, nosso chefe e nosso colega de trabalho na mesma mesa de bar –às vezes, ao mesmo tempo. Não é estranho que a gente esteja com um pouco de birra de tudo. Ainda mais quando ela tem tantos atrasos, tantas conexões perdidas e outras pequenas irritações que compõe a nossa relação diária com a tecnologia.
Bom, e o que fazer então? A primeira coisa é reconhecer o problema —algo que tentei ajudá-lo a fazer até aqui. Também ajuda estabelecer alguma rotina em que a gente possa alternar videoconferências com outra atividade que seja mais presencial —seja você com as pessoas da casa ou consigo mesmo.
Outra boa dica é que, parece, por áudio —no velho telefone, por exemplo — esse tipo de fadiga não acontece, ao menos com tanta força. Então, pense se não seria caso de, em algumas dessas reuniões ou conferências pela web, simplesmente tirar o vídeo. Ou, ao menos, tente ocultar a janela onde você próprio aparece, nas plataformas de videoconferência em que isso é possível.
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